Olhar Social: fotografar ou ajudar?
- Daiane Gasparino
- 13 de mar. de 2014
- 3 min de leitura
Fotos como a do homem que foi empurrado por um mendigo na linha do trem em Nova York no fim do ano passado são bastante discutidas pela crítica e pela sociedade. O que fica no ar é se o ato jornalístico deve se manter em situações como essas, menosprezando, de alguma forma, o ato humano. Por que o fotógrafo não ajudou Ki-Suck Han quando este foi lançado ao trilho enquanto o trem se aproximava? E qual a finalidade de uma imagem tão trágica como essa?
O que se sabe é que a cena que aconteceu na estação de Times Square, em Nova York, teve em seu total, míseros 22 segundos. Pouco tempo para tentar fazer algo, pouco tempo para tentar salvar uma vida. Um homem discutia com um mendigo na plataforma. De repente, Ki-Suck Han, 58, tinha sido empurrado pelo mendigo para os trilhos.
O fotógrafo freelancer R. Umar Abbasi esperava o trem quando viu o homem caído e começou a clicar alegando que estava usando apenas o flash para chamar a atenção do condutor do trem. Alegou também que não teria tempo suficiente para ajudar o homem, que sentiu medo de ser empurrado junto para o trilho e que havia outras pessoas também na plataforma, mas ninguém se mexeu.
Por quê? Por medo? Por se sentir incapaz de salvar uma vida? Ou porque esse não era o seu papel? Talvez fosse dos guardas de segurança da estação ou mais ainda, talvez fosse papel da própria vítima tentar se salvar.
A foto foi capa de um tabloide com os seguintes dizeres: “CONDENADO – Este homem está prestes a morrer”. O que pensar diante de uma situação como essa? Desacredito na solidariedade humana. Até que ponto a profissão fala mais que o ato humano?
Sabemos que como regra geral, fotógrafos e repórteres não devem fazer nada em situações como essas. Apenas registrar os fatos, o que não é pouco se colocarmos em questão guerras e epidemias, por exemplo.
Mas aí entra o papel como ser humano. Quando se age por instinto para tentar salvar uma vítima. O coração nessas horas não costuma deixar a razão ganhar. Ele age. Ele tenta, mesmo sem saber se vai conseguir mudar o rumo da história.
A polêmica nos lembrou da famosa fotografia da criança faminta observada por uma ave de rapina do fotógrafo Kevin Carter tirada no Sudão, em 1993. A imagem que foi premiada como símbolo da luta contra a fome atormentou o autor, que precisou responder para a mídia e a sociedade por que não ajudara a criança. Com diferentes versões, Carter disse que não era preciso, pois havia um centro de distribuição de alimentos ali perto, que a criança se levantou sozinha e que ele mesmo tinha afastado o animal. Um ano depois de registrar tal cena, o autor, que tinha vários problemas, se matou.
Argumentar sobre a ética no fotojornalismo não é tão fácil quanto se parece. Enquanto alguns não perdem a oportunidade de registrar uma boa foto, outros simplesmente se esquecem do motivo para que estão ali e seguem o instinto. Aquele de ajuda, de
compaixão e amor ao próximo. Temos exemplo de um profissional que estava cobrindo uma guerra e ao ver um pai carregando o filho ferido, não pensou duas vezes, correu para ajudar. A criança não se salvou e o gesto humano se tornou meio sem sentido para o repórter que deixou de fotografar e tentou mudar o destino de uma vida. Sim, porque o coração ainda pulsava no momento em que a foto podia ter sido tirada. A esperança ainda existia, mesmo que mínima.
Casos como esses nos fazem pensar na frieza da imprensa, na preocupação de um furo jornalístico. O ser humano tem se preocupado mais com o seu ego e se promovido à custa do sofrimento alheio. É inaceitável que não se faça nada. E é comum que todos queiram culpar alguém. No caso do homem jogado ao trilho, a culpa não é apenas do mendigo que o empurrou. Qual o grau de erro daquele que fotografou junto com os que publicaram? São questionamentos que nem sempre se tem respostas.
O ser humano antes de ser forte e herói, é fraco e sente medo. Nunca se sabe a verdadeira reação até passar pelo teste. Muitos acreditam que salvariam a vida desse homem, mas somente quem passa pela situação tem os instintos testados e descobre sua verdadeira reação. Neste momento, a experiência pode se tornar frustrante.
O papel da foto é levar o leitor até a cena. Ela remete detalhes que um texto talvez não consiga transmitir. A foto traz a realidade e deve ser publicada como ela de fato é. Mas antes de profissionais, somos humanos. E junto com essa ideia, deve vir o respeito e a ética. O respeito ao se colocar no lugar da vítima e ética para ser não apenas um profissional melhor e com a consciência tranquila, mas um ser humano bem resolvido consigo mesmo.
Comments